Fotografia © Patrick Clenet | Via Wikimedia Commons
A torre data do século IX e os murais são do século XV, e constituem "uma autêntica viagem no tempo", diz o vereador da Cultura.
Pinturas murais do século XV e uma torre islâmica do século IX foram encontradas no castelo de Abrantes, "achados únicos" que resultaram de trabalhos arqueológicos ali realizados e que vão permitir "reescrever a história" da cidade.
Em declarações à agência Lusa, o vereador da Cultura da Câmara de Abrantes, Luís Dias, disse que estes achados, que incluem, entre outros, ossadas junto de um possível templo em honra do deus Mercúrio, moedas e munições para canhões dos tempos napoleónicos, vão permitir "perceber melhor e ajudar a reescrever a história de Abrantes", cidade que está situada num morro e é banhada pelo rio Tejo.
"Estas extraordinárias descobertas, autenticadas por especialistas de várias universidades, [constituem] uma autêntica viagem no tempo para uma cidade que está prestes a assinalar o seu centenário [14 junho de 2016] e que tem registos históricos de ocupação com mais de 7 mil anos", destacou.
As escavações arqueológicas, feitas no âmbito da terceira campanha de escavações aprovada em 2013 pela Direção-Geral do Património Cultural (DGPC), decorreram nos meses de junho e julho, e tinham por objetivo obter informações sobre a ocupação proto-histórica, romana e islâmica, bem como conhecer as obras de fortificação da Idade Moderna, em trabalhos multidisciplinares desenvolvidos pelas equipas de arqueologia e património da Câmara de Abrantes e do projeto do Museu Ibérico de Arqueologia e Arte (MIAA).
As "pinturas raras" encontradas no interior da Capela da Igreja de Santa Maria do Castelo, templo quatrocentista classificado como Monumento Nacional localizado no interior da fortificação, (local onde D. João I reuniu o Conselho de Guerra a 6 de agosto de 1385 para a Batalha de Aljubarrota), foram datadas como sendo da primeira metade do século XV pelos investigadores do Laboratório Hércules, e apresentam afinidades estilísticas com a pintura de S. Francisco de Leiria e a da capela do Palácio da Vila, em Sintra.
"Este é um achado extraordinariamente importante", disse à Lusa Milene Gil, investigadora do Laboratório Hércules, da Universidade de Évora, tendo destacado que as pinturas "são das mais antigas que existem em Portugal em termos de pintura mural porque datam do século XV".
"São frescos e são bons frescos porque estão em excelente estado de conservação, o que é extraordinário", frisou.
Os frescos estão localizados na parede esquerda do altar-mor, por detrás do túmulo de D. Lopo de Almeida, permitindo perceber a continuidade da decoração mural.
Outra descoberta que os investigadores e arqueólogos destacaram à Lusa foi a "confirmação e localização de uma torre islâmica em tijolo de adobe, um reforço defensivo das torres islâmicas", edificada dentro do que é hoje o castelo de Abrantes, junto da muralha proto-histórica.
"Nós já tínhamos encontrado vestígios de ocupação islâmica mas nunca elementos que provassem que aqui tivesse existido uma fortificação por eles construída", disse à Lusa a arqueóloga municipal Filomena Gaspar.
"Esta é uma novidade espetacular porque esta torre permite perceber que estiveram aqui, não só de passagem, mas o tempo suficiente, algures entre o século IX e XI, para terem construído estruturas defensivas na passagem do Tejo. Este é o local mais interior do país com uma torre deste género, feita com barro, material muito perecível, e existem muito poucas em Portugal", explicou.
Os recentes achados arqueológicos no interior e nas imediações do castelo de Abrantes deram um novo impulso à ideia da autarquia de construir um modelo de regeneração urbana com base num "centro cultural a céu aberto".
Maria do Céu Albuquerque (PS), presidente da Câmara de Abrantes, disse à Lusa que o projeto se insere no âmbito da construção do Museu Ibérico de Arqueologia e Arte (MIAA) e que está delineado para ser implementado em diversos locais da cidade.
"É um investimento global na ordem dos 14 milhões de euros e é uma intervenção que não se pode fazer toda de uma só vez", disse, acrescentando que o mesmo "é para ir fazendo e construindo paulatinamente, à medida que se vão fazendo novas descobertas, à medida das capacidades da autarquia para o concretizar e à medida das novas oportunidades de investimento", no quadro de fundos comunitários.
Os trabalhos das equipas de investigação contaram com a colaboração de jovens voluntários abrantinos e com os apoios do Centro de Geociências da Universidade de Coimbra, do Centro de Pré-História do Instituto Politécnico de Tomar, do Instituto Terra e Memória de Mação, do Centro de Interpretação de Arqueologia do Alto Ribatejo, e do Laboratório Hércules da Universidade de Évora, no âmbito das ciências físico-químicas aplicadas à arqueologia.
fonte: Diário de Noticias