As células tumorais foram tingidas com um corante para se poder visualizar o tumor RITA FIOR
Dois investigadores portugueses criam novo modelo que pode vir a tornar-se num teste de rotina para verificar a eficácia da quimioterapia.
São resultados preliminares, "uma prova do conceito", como lhe chama Rita Fior, da Fundação Champalimaud. Mas o trabalho que a investigadora desenvolveu com Miguel Godinho Ferreira, também da Fundação Champalimaud e do Instituto Gulbenkian de Ciência (IGC), e que acaba de ser publicado na revista Proceedings of the National Academy of Sciences (PNAS), pode ser o caminho para um novo teste capaz de estimar em poucos dias a eficácia de um tratamento de quimioterapia em doentes com cancro - e ajustar a terapia a cada doente.
Rita Fior e Miguel Godinho Ferreira demonstraram a possibilidade de prever os efeitos de um tratamento de quimioterapia, testando as células tumorais do doente em larvas de peixe-zebra, um modelo animal muito utilizado em laboratório. Neste caso, a pequena dimensão da larva, com menos de um centímetro, torna estes testes muito rápidos.
Na sua prova de conceito, os dois investigadores portugueses e as suas equipas estudaram os casos de cinco doentes com cancro colorretal que foram tratados na Fundação Champalimaud e no Hospital Amadora-Sintra. O que a equipa fez foi implantar células tumorais dos doentes nas larvas de peixe-zebra, e depois testar nos tumores assim criados o tipo de quimioterapia que cada um dos doentes tinha recebido.
Os resultados não podiam ser mais promissores: em quatro dos cinco casos, os resultados nas larvas foram idênticos ao que aconteceu com os próprios doentes. Dois deles não responderam bem ao tratamento, e os tumores induzidos nas larvas também não. Em relação a outros dois, que responderam bem ao tratamento, as larvas seguiram exatamente o mesmo padrão. O teste funcionou.
Agora é necessário alargar o estudo e comprovar que funciona para todos os casos, ou pelo menos para a esmagadora maioria deles. "Nesta segunda fase, que já se iniciou, vamos testar centenas de doentes da Fundação Champalimaud e do Hospital Amadora-Sintra, com o qual estabelecemos um protocolo e que tem sido muito colaborativo", adianta Rita Fior.
Os dois cientistas esperam que o estudo esteja concluído dentro de dois a três anos e, se tudo correr como acreditam, o resultado poderá ser um novo teste para prever com grande rapidez a eficácia (ou não) de um determinado tratamento escolhido.
"Se tudo correr bem, vamos poder informar os oncologistas do resultado das várias terapias nos avatares [as larvas, que simulam o doente]; serão sempre eles a ter de escolher o tratamento, mas poderão fazê-lo com base em testes individuais", explica por seu turno Miguel Godinho Ferreira, citado num comunicado da Fundação Champalimaud.
A escolha das larvas do peixe-zebra para simular os tratamentos de quimioterapia é a chave certa e tem a grande vantagem da rapidez. "Conseguimos resultados sobre a eficácia de um determinado tratamento em três ou quatro dias", explica a cientista.
Os tratamentos de quimioterapia são atualmente aplicados seguindo diretrizes internacionais estabelecidas de acordo com as estatísticas das taxas de sucesso obtidas em ensaios clínicos. Se o teste desenvolvido pelos dois cientistas portugueses comprovar a sua eficácia, abrem-se novas possibilidade de personalização e de maior precisão nos tratamentos.
"Isso não pode ser feito por rotina em ratos, porque os tumores produzidos com células tumorais dos doentes levam meses a tornar-se visíveis e a poderem ser testados, porque o rato é um animal grande", nota Rita Fior. Na larva de peixe-zebra basta introduzir-lhe poucas células do tecido tumoral para produzir um tumor que pode ser testado.
A ideia de utilizar as larvas de peixe-zebra neste contexto surgiu aos dois cientistas separadamente - estavam na altura ambos no IGC, mas em grupos distintos - mas quando se aperceberam disso decidiram avançar com o estudo conjunto. Em boa hora. Os resultados mostram que estavam certos.
fonte: Diário de Noticias