(dr) Ishan Agarwal Sapo pigmeu da Serra da Neve
É minúsculo e não tem ouvidos. Na Serra da Neve, em Angola, foi descoberto um sapo que se esconde debaixo das pedras e da camada de folhas, no solo húmido.
Só o podemos encontrar na Serra da Neve, na província do Namibe, em Angola e a sua característica que mais capta a atenção é a ausência de ouvidos. Estamos a falar do sapo pigmeu da Serra da Neve, agora descrito cientificamente por uma equipa internacional de investigadores, cujo primeiro autor do trabalho é o biólogo português Luís Ceríaco.
O animal foi localizado numa expedição em novembro de 2016 à Serra da Neve, o segundo pico mais alto de Angola, com 2489 metros de altitude. Conhecido pelos geólogos como “monte-ilha”, a Serra da Neve é muito interessante na medida em que está isolada de outras montanhas, permitindo assim a evolução de espécies únicas.
De acordo com o Público, o sapo pigmeu da Serra da Neve vive a quase 1500 metros de altitude e vive debaixo de rochas e folhas, junto ao solo húmido. Com apenas 31 milímetros de comprimento, o exemplar serviu de referência para descrever a nova espécie. Atualmente, encontra-se no Museu de História Natural da Universidade da Florida, nos Estados Unidos.
Poyntonophrynus pachnodes é o nome científico escolhido pela equipa para o novo sapo pigmeu. O nome específico – pachnodes – significa “gelado” em grego, uma referência ao nome da serra e às temperaturas baixas registadas à altitude em que se encontra nova espécie.
Depois de apanhados seis exemplares, a equipa de investigadores de Angola, Portugal e dos Estados Unidos regressou ao laboratório para estudar a espécie, usando técnicas genéticas e de anatomia. O artigo foi publicado recentemente na revista ZooKeys.
O detalhe que mais captou a atenção dos cientistas foi o facto de, tanto o ouvido externo como o interno, relacionados como a audição noutras espécies de sapos e rãs, estão completamente ausentes nesta espécie.
Luís Ceríaco, biólogo português, refere que “o facto de não ter ouvidos é interessantea vários níveis”. Trata-se de “um caso de perda total de ouvido médio interno e todas as suas estruturas associadas, numa linhagem evolutiva em que todas as espécies congéneres o possuem”.
Segundo o especialista, esta perda do ouvido acontece em várias outras linhagens de sapos da família Bufonidae, facto que ainda é um mistério evolutivo. No entanto, ainda não se conhecia nenhum caso deste género (Poyntonophrynus).
“Assim, juntamos mais uma peça a este puzzle evolutivo e, quiçá, com mais dados consigamos dar resposta a esta questão”, assinala o biólogo português sobre a importância da descoberta.
Permanece no ar a dúvida: não tendo ouvidos, como é que o sapo pigmeu da Serra da Neve ouve os chamamentos de acasalamento? “A questão de ouvir os chamamentos de outros elementos da sua espécie está em aberto”, explica Luís Ceríaco.
Nos sapos e nas rãs, os chamamentos são de “extrema importância” durante a época de acasalamento e para o estabelecimento de território. “Ora se o animal não tem ouvidos, à partida não ‘ouve’. Este facto tem intrigado a comunidade científica há várias décadas, mas nos últimos anos têm sido propostos vários mecanismos pelos quais os animais sem ouvidos podem ‘ouvir’ ou pelo menos receber as mensagens”, indica o biólogo.
“Há casos em que a própria a cavidade bucal dos animais funciona como caixa de ressonância e, de certa forma, funciona como ouvido. Noutros casos, os animais não ouvem o parceiro, mas veem o movimento do saco vocal a encher-se e desencher-se e compreendem a mensagem”, acrescenta. Além disso, há animais que desenvolveram uma sinalização visual, como acenos.
No caso do sapo pigmeu da Serra da Neve, “ainda não sabemos quais destes mecanismos – se de facto usa algum – desenvolveu”, conclui.
fonte: ZAP