Investigadores americanos já estão a testar um protótipo em humanos e acreditam que pode ser uma solução para o Alzheimer.
A memória é um processo complexo que ainda guarda mistérios para os neurocientistas, mas isso não impede que vários grupos estejam já a tentar imitar o seu funcionamento para produzir as primeiras próteses de memória. Ficção científica? Nem por isso. Um primeiro passo, que foi anunciado nesta semana numa conferência internacional em Milão, propõe o implante cerebral de um chip que, ligado a elétrodos e a um computador, conseguirá imitar a atividade elétrica cerebral que transforma as memórias de curto prazo em memórias permanentes. Esta é também uma nova esperança para as pessoas com lesões cerebrais ou doenças neurodegenerativas que afetam irreversivelmente a memória, como a doença de Alzheimer, garantem os cientistas.
O princípio, já testado com sucesso em ratinhos e em macacos, foi desenvolvido na última década por investigadores da Universidade do Sul da Califórnia e neurologistas do Wake Forest Baptist Medical Centre, na Carolina do Norte, nos Estados Unidos, e tem como futuros primeiros destinatários os veteranos de guerra americanos que, em resultado de lesões cerebrais, ficaram com a memória afetada. O projeto tem sido, aliás, financiado pela DARPA, a agência para a investigação de projetos avançados para a defesa, nos Estados Unidos, com esse mesmo objetivo.
Apresentado na terça-feira, na conferência anual da IEEE, a maior sociedade internacional de engenharia biomédica, o projeto baseia-se num algoritmo, uma espécie de receita matemática que codifica instruções, e que neste caso imita a atividade elétrica cerebral envolvida na formação das memórias permanentes, a partir de uma determinada informação.
Isso permitiria então contornar a lesão cerebral e produzir uma memória eletrónica que poderia ser usada sob a forma de um chip.
Como explica o coordenador do projeto na Universidade do Sul da Califórnia, Ted Berger, "com informação suficiente sobre a codificação neural das memórias, esta prótese neural será capaz de identificar e manipular, em tempo real, o processo de codificação e, assim, poderá restaurar e até melhorar os processos cognitivos da memória". Segundo o mesmo investigador, citado pelo jornal britânico The Financial Times, é um pouco como "conseguir traduzir do espanhol para o francês sem precisar de conhecer nenhuma das duas línguas", já que tudo se passa através de sinais eletivos codificados no chip.
Os sinais neurais envolvidos nesta transformação de memórias imediatas em permanentes foram traduzidos no tal algoritmo que está agora a ser utilizado, a partir de dados obtidos de nove pessoas com epilepsia que têm elétrodos implantados no hipocampo (um dos centros cerebrais da memória) para evitar o surgimento de convulsões.
Depois dos testes em ratinhos e em macacos, o dispositivo está agora a ser testado em cérebros humanos, explicou a equipa na conferência em Milão, sem adiantar, no entanto, resultados concretos desse trabalho.
Os cientistas mostraram-se otimistas em relação a um produto definitivo. "Conseguir prever os sinais neurais com este modelo sugere que ele pode ser usado para criar um dispositivo que substitua a função destruída no cérebro", concluem.